A convidada da Sexta-Feira 13 de hoje é a maquiadora, diretora, efeitista, a multifacetada Ales de Lara, que vai falar como foi o início da sua relação com os filmes de terror.
Qual filme me fez gostar de cinema de horror? Que pergunta difícil. Vejo muitas pessoas falando sobre o tema com a resposta na ponta da língua. Sinto decepciona-los, mas eu não faço nem ideia. Recentemente minha mãe me mandou uma foto só meu aniversário de 4 anos, em 1988, com a pergunta: “qual criança pede um aniversário de fantasmas e aranhas?”. O Halloween ainda não era popular no Brasil, isso começou a acontecer só na década seguinte. Na foto uma teia gigante com uma aranha enorme na parede, lembro que os brigadeiros eram aranhas, todos com perninhas. O horror sempre esteve lá, entende? Na sétima série eu tinha um grupo de amigas que iam na minha casa só para assistirmos filmes de terror, alugávamos 3 ou 4 e assistíamos em sequência. Então essa pergunta sobre o primeiro filme marcante é impossível de ser respondida, mas para não deixar uma grande incógnita aqui, vou citar alguns dos filmes que me marcaram ainda criança/adolescente e que fazem parte dos meus filmes favoritos: Carrie, a Estranha; Gremlins 1 e 2; Cemitério Maldito; A Pequena Loja de Horrores (o remake nesse caso); Os Fantasmas se Divertem; O Iluminado; Godzilla (a série da tv) e também Goosbumps, entre outros que com certeza minha memória deixou escapar no momento. Sei que a lista parece meio doida, mas não é só de puro horror que vive o homem. O terrir, terror com comédia, também é grande integrante do meu gosto pessoal.
A consequência de não saber qual filme especifico me trouxe para esse universo é que eu não sei narrar a sensação que senti nele. Mas vou contar algumas histórias. Eu era muito medrosa quando criança, apesar de já ter gosto por coisas macabras. Eu nunca fui muito fã de bonecas e um dos meus irmãos, de sapecagem infantil, me mostrou o filme Chucky, o Brinquedo Assassino, quando eu tinha uns 5 anos e a sensação foi de puro terror, até porque eu dormia num quarto cheio de bonecas. Eu também tinha muitos pesadelos na infância, então A Hora do Pesadelo também era um filme que me assustava muito.
Quando o filme O Estranho Mundo de Jack foi lançado eu tinha apenas 9 anos e eu lembro do trailer do filme passar numa fita que eu ia assistir com a minha mãe. Estávamos vendo o trailer e minha mãe falou algo como “parece legal, vamos assistir?”, mas aí apareceu uma criança tirando de um pacote de presente uma cabeça decapitada e eu com medo disse que não (lembre que eu falei que era medrosa). Levou alguns anos para esse filme chegar de fato no Brasil, naquela época esperávamos uns 3 anos do trailer até ver o filme realmente. Eu vi ele na locadora, mas não aluguei. Na vez seguinte que fui até lá a curiosidade me tomou e resolvi dar uma chance, afinal agora eu era “grande”. Quando o filme começou eu me apaixonei instantaneamente. Senti meu coração acelerar com a trilha sonora e o ambiente sombrio. Gremlins, por sua vez, me divertia horrores. Numa época onde os monstros famosos eram criaturas gigantescas ou humanoides fortes, a invasão de pequenas criaturinhas encapetadas, que eram até fofinhas (até comerem depois da meia noite e ficaram verdes e purulentas) atiçava minha imaginação e me fazia pensar que os pequenos também poderiam representar perigo (uma identificação pessoal, acho). Também nessa linha, Carrie me apresentou uma mulher fora do padrão que eu estava acostumada a ver nos filmes. Ela não era a mulher perfeita dona de casa, nem a bem sucedida, nem a super heroína, nem a totalmente burra. Ela se tornou a “mulher monstro” e por mais que existam muitas discussões a respeito da representatividade monstruosa da mulher como algo negativo, pra mim foi incrível ver uma mulher sendo a ameaça e torrando todo mundo. Ela se liberta do papel de vítima se tornando um perigo para os outros e foi um marco enorme pra mim, que estava acostumada a ver as mulheres só fugindo escada acima ao invés de saírem pela porta ou super mulheres fodonas que eram capazes de sobreviver as mais terríveis ameaças. Ela abriu uma gama nova de possibilidades em minha mente.
Enfim, eu defendo a teoria de que filmes de terror são um ambiente seguro para que possamos trabalhar nossos próprios medos, e hoje, a garotinha assustada que vivia em mim é só uma lembrança, assim como essas histórias.
Agradeço a oportunidade de escrever para essa coluna e revisitar minha memória, muitas vezes adormecida e focada apenas no presente. Também pela permissão de ser menos didática e mais contadora de histórias, coisa que não faço muito, mas que gosto. Espero não ter me perdido demais em devaneios e que vocês compreendam o que tentei contar. Um grande abraço!
Pós Graduada em Cinema, Maquiadora de caracterização desde 2013 e efeitista desde 2019. Participou de oficinas de maquiagem de caracterização e efeito com Andréia Tristão e Rodrigo Aragão, e de roteiro com Paulo Biscaia Filho. Atua principalmente no audiovisual como maquiadora, diretora e figurante desde 2015. Dirigiu curtas como Manequim premiado com melhor direção no Festival Djanho, Isolada, que ganhou segundo lugar no “Prêmio Curta Em Casa da Cardume”, Vai Ter Que Engolir que chegou nos finalistas do T.I.F.A Tietê Internacional Film Awards. Ganhou primeiro lugar na categoria monstros da primeira “Convenção Lillac” de maquiagem artística e é finalista do reality show Cinelab Aprendiz segunda temporada.