Comédia dramática do diretor Alexandre Payne é cativante e tem um Paul Giamatti numa atuação impecável
Por Nilvio Pessanha
Paulo Freire, patrono da educação brasileira, deixou uma vasta obra e inúmeras lições para educadores e educandos. Entre essas lições temos duas que me surgiram enquanto assistia a “Os Rejeitados”, novo filme do diretor Alexandre Payne que acompanha Paul Hunham (Paul Giamatti), um professor de um internato que não tem o apreço nem dos alunos nem dos seus colegas professores e é escalado para ficar com alguns alunos durante o recesso de fim de ano.
Durante a trama, o controverso professor tem de lidar com o rebelde aluno Angus (Dominic Sessa), e aí que vemos um dos ensinamentos de Paulo Freire que podem ser percebidos no filme, o de que o professor deveria ser sensível à história de vida dos alunos, aos seus sofrimentos, às suas mazelas. E é somente quando Paul Hunham começa a se deixar se aproximar, a enxergar melhor o seu aluno Angus, que a relação começa a mudar. E isso leva ao segundo ensinamento freiriano que, apesar de parecer clichê, nunca pode ser deixado de lado por qualquer um que se predispõe a ensinar algo: “Quem ensina aprende ao ensinar. E quem aprende ensina ao aprender”. À medida que a relação entre o professor odiado e o aluno rebelde melhora, a troca entre o ensinar e o aprender se faz notória. Sentimentos como cumplicidade e confiança surgem a ponto de humanizar ambos. E essas reflexões são elementos preponderantes para fazer com que o filme seja tocante e sensível como ele o é.
Nada do que foi dito acima, porém, seria possível sem dois fundamentais fatores. Primeiro o principal deles que é a direção bastante competente e sutil de Alexander Payne. O humor ácido, característica do cineasta, está bastante presente nesta “dramédia”, mas tudo de forma bem equilibrada e dosada. Como mencionado, “Os Rejeitados”, assim como em outras obras de sua filmografia, Payne aborda muito bem temas como questões como existencialismo e solidão ligadas ao envelhecimento, problemas de relacionamento entre gerações diferentes (como em “As Confissões de Shimidt” e “Os Descendentes”) e problemas relacionados a relações interpessoais (como em “Sideways”). Outro fator que contribui muito para a qualidade do filme é a excelente atuação de Paul Giamatti, parceiro do diretor em “Sideways”. Aqui o ator estadunidense consegue passar por meio de suas ações o porquê da repulsa dos estudantes a ele e também demonstra sua fragilidade tanto física quanto emocional. Realmente é uma atuação digna de ser lembrada na temporada de prêmios. Claro que ele não está sozinho. Da’Vine Joy Randolph está ótima como a cozinheira Mary e Dominic Sessa também está muito bem como o aluno problemático Angus.
“Os Rejeitados”, que chega agora aos cinemas nacionais, é um filme tocante, com uma direção bastante competente, um elenco com ótimas atuações e que, além de tudo isso, nos faz lembrar de ensinamentos de um mestre que nos mostrou que ensinar e aprender pode ser uma relação de troca e que devemos estar atentos às dores dos outros, aos sofrimentos dos outros. Isso pode nos fazer, acima de tudo, mais humanos ou melhores seres humanos.